foco Takumã Kuikuro
A trajetória de Takumã Kuikuro no cinema tem início com a chegada da equipe de Vincent Carelli, coordenador do Vídeo nas Aldeias (VNA), ao sul da Terra Indígena do Xingu, no Mato Grosso, há mais de vinte anos. O VNA é a iniciativa mais relevante que temos para a promoção, valorização e divulgação dos cinemas realizados por povos originários no Brasil. Desde o final dos anos 1980, o projeto propõe experiências e oficinas de audiovisual, equipando e capacitando os indígenas para que registrem e se façam protagonistas de suas próprias histórias, em exercícios audiovisuais marcados pela reflexividade e pela tarefa de dar visibilidade a seus modos de vida, suas lutas e suas cosmovisões. Takumã Kuikuro filma pela primeira vez no contexto de uma dessas oficinas – e nunca mais paro de filmar.
Após algumas experiências realizando filmes em coletivo ou em parcerias com não-indígenas, como o longa As hipermulheres (2012), Kuikuro decide estudar montagem na Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Rio de Janeiro. Desde então, sua obra só cresceu, variando entre filmes realizados para exibição na aldeia, em geral com poucos cortes e longa duração, praticamente uma reunião do material bruto, e os que realiza para os não-indígenas, em sua maioria curtas e médias. Takumã é hoje um dos cineastas indígenas mais reconhecidos tanto nacional quanto internacionalmente. Seus filmes já receberam diversos prêmios, entre eles, em Gramado e no Présence Autochtone, da associação Terres em Vues, em Montréal, no Canadá. Além de realizar seus filmes, ele já foi convidado para ministrar oficinas de audiovisual e participar de comissões julgadoras, tendo sido o primeiro jurado indígena do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 2019. O 1º Festival de Cinema e Cultura Indígena (FeCCi) realizado no Alto Xingu e em Brasília, em 2022, é mais um desdobramento de seu trabalho.
Os quatro filmes reunidos neste lançamento da Embaúba Play – Karioka, Território Pequi, Ete London e Câmera é a flecha – foram escolhidos pelo próprio cineasta para representar sua produção recente, a convite da curadoria. Em tese dedicada à filmografia de Takumã Kuikuro, a pesquisadora Sabrina Alvernaz Silva Cabral defende a ideia de que, ao fazer cinema, Takumã faz poesia, agenciando “imaginações conceituais” (a expressão é de Ailton Krenak), que permitem pensar e conhecer não apenas o modo de vida e a cosmovisão kuikuro, como também a potência do encontro entre alteridades, mediado pelas câmeras cinematográficas. Esperamos que a presente seleção de curtas ofereça uma amostra da força política e poética dos filmes de Takumã Kuikuro, realizador que considera o cinema, em suas próprias palavras, “uma ferramenta de resgate de cultura e de luta”.